Ok, notícia de 2008. Porém, assunto sempre atual e super importante: a questão da dor em bebês prematuros. Como identificar quando ela existe? Qual a melhor maneira de medir sua intensidade? Como tratar? Confiram a entrevista!
Por Marcela Buscato para Época (18/07/08)
Dr. Ricardo Carbajal é chefe do Centro Nacional de Recusros de Luta contra a Dor do Hospital Infantil Armand Trousseau.
Ele acompanhou 24h por dia a rotina de 430 bebês internados em Paris. Descobriu que apenas 25 recebiam tratamento para dor.
Para o pediatra, autor de um dos maiores estudos sobre o sofrimento nas UTIs neonatais, médicos ignoram conseqüências futuras da dor para os bebês.
ÉPOCA - Seu estudo mostra que muitos procedimentos invasivos são feitos sem medicação para dor. Por que isso ainda acontece?
Ricardo Carbajal - É por falta de conhecimento, falta de familiaridade ou desconsideração deliberada das evidências atuais em relação ao tratamento de dor em recém-nascidos. Outro motivo é falta de procedimentos-padrão para controlar dor, que variam muito na prática médica. Não temos, por exemplo, métodos muito precisos para avaliar a dor. Faltam políticas de saúde pública sobre esse assunto. A pressão dos pais e da sociedade é importante para que o controle da dor em bebês se torne uma obrigação.
ÉPOCA - Por que medicamentos analgésicos não são muito usados em bebês?
Carbajal - Alguns médicos também têm um grau exagerado de preocupação com os efeitos colaterais dos analgésicos: eles continuam mais preocupados em tratar pulmões imaturos, infecções e lesões cerebrais, do que com as conseqüências da dor. Outro motivo é que não há muitos remédios para recém-nascidos. As empresas farmacêuticas não prestam muita atenção no desenvolvimento de analgésicos e fórmulas específicos para bebês dessa faixa etária. Esse não é um negócio muito lucrativo.
ÉPOCA - Por que soluções doce são eficazes para aliviar a dor em alguns procedimentos? O quanto essas medidas já estão sendo usadas?
Carbajal - Soluções doce têm propriedades analgésicas em bebês, principalmente nos menores de 3 meses. Provavelmente, elas provocam a liberação substâncias analgésicas produzidas pelo nosso próprio organismo. Embora essas práticas já sejam conhecidas em muitos hospitais, elas continuam sem ser usadas freqüentemente porque o controle da dor ainda não é uma prioridade.
ÉPOCA - Alguns estudos sugerem que a exposição repetitiva à dor pode causar distúrbios de aprendizagem e de comportamento. Por quê?
Carbajal - A dor aguda provoca mudanças no organismo, como diminuição da oxigenação, taquicardia e mudanças do fluxo do sangue no cérebro. A exposição repetitiva e prolongada a esses procedimentos pode modificar a maneira como nosso corpo processa a dor. Isso pode afetar o desenvolvimento e o comportamento dessas crianças no futuro.
ÉPOCA - Como podemos ter certeza de que distúrbios de aprendizagem e de comportamento podem ser causados pela dor e não pelos demais problemas enfrentados por prematuros?
Carbajal - Muita pesquisa ainda precisa ser feita nessa área para descobrimos a real contribuição de cada um dos diferentes agentes estressores. Mesmo assim, estudos com bebês nascidos após a gestação completa e com prematuros já mostraram que a dor da circuncisão, picadas repetitivas no calcanhar e a dor causada por cirurgias têm efeitos deletérios a longo-prazo.
ÉPOCA - Atualmente, bebês muito prematuros já conseguem sobreviver. Mas a medicina está preparada para oferecer tratamentos que não os façam sofrer e para proporcionar boa qualidade de vida?
Carbajal - Claro. Cada vez mais os profissionais de saúde estão preocupados com a qualidade de vida dos bebês prematuros.
Fonte: Revista Época