14 de Julho de 2023
Pequena Helena
Sabe aquele dia que você sonhou a vida inteira e nunca acreditou que aconteceria? Era dia 17 de junho de 2019 e me senti enjoada, cansada e com uma sensação diferente. Por volta das 16h me deu "start" em fazer um teste rápido de gravidez (mais um que ia dar negativo). Fui ao banheiro, fiz e mal olhei, pois qual a possibilidade de dar positivo, né? Afinal já tinha 37 anos e centenas de problemas ginecológicos desde a adolescência. Do nada enquanto o teste ia ficando pronto fui tirando a roupa para adentrar ao banho como já era rotina.
Porém, de repente olhei para ele e lá estava dois, sim, dois risquinhos pela primeira vez. Não acreditei, sentei, chorei muito olhando para ele com a mão na barriga e pensando: deve ser um falso positivo. Tomei meu banho chorando muito, com vários sentimentos passando. Assim que me acalmei, fiz uma gravação em vídeo para meu namorado, pois queria que ele participasse de tudo (caso fosse gravidez mesmo), mas queria ter certeza.
No dia seguinte, 18 de junho, precisava realizar exames de hormônios para tireóide (outra doença que tenho), aproveitei que estava no laboratório e despojada perguntei pra atendente o valor de um teste quantitativo de gravidez, lembro ela de canto de olho sorrindo falando 50,00 reais e o resultado sai no mesmo dia. Fiz o teste para ter certeza e tudo foi gravado para meu namorado ver no futuro o que estava acontecendo. Ao sair do laboratório e entrar no carro, senti algo muito, mas muito diferente no mundo ao meu redor, sim, me senti grávida. Corri para a loja e comprei um body e um par de sapatinhos para contar pro namorado (mesmo sem o resultado oficial).
No fim da tarde saiu o dito cujo e eu ESTAVA GRÁVIDA. Gravei outro vídeo para o meu namorado e me perguntava como contar isso pra ele? E para os meus pais? E para os pais dele? Meu Deus. Em minutos planejei praticamente toda minha gravidez na mente (como já diz o ditado: "a mente nos mente", né).
Dia 20 de junho, era feriado de Corpus Christi, então levei meu namorado para almoçar e revelar a notícia. Combinei com o restaurante de dar o presente para ele na hora que ele pedisse a conta, assim seria surpresa. Eu já estava vomitando muito, mas como sempre fui enjoada, isso não foi preocupação. E assim, ele me olhando durante o almoço e eu mal conseguindo comer, ele me elogiando e eu me tremia toda. Imagina então quando o garçom apareceu com uma caixinha branca e ele abriu? Foi um misto de alegria, medo e insegurança. O novo papai ficou tão perdido que quase esqueceu de pagar a conta e já não sabia o caminho de casa. Ele ficou tão feliz, que engravidou comigo. Compramos roupinhas para contar aos avós o mais rápido possível, pois minha saúde já não era tão boa. Resolvemos que só divulgaríamos para a sociedade após o terceiro mês. E assim foi.
Fizemos o primeiro USG, e nossa primeira lágrima a escorrer foi de ouvir o coração de um ser minúsculo dentro de mim. O novo papai todo ansioso precisava saber se era menino ou menina, então fizemos a sexagem e um chá revelação onde já tínhamos nome definido e tudo planejado até o fim da gestação. Saber que a Helena ia chegar foi um momento único, que nosso mundo seria cor de rosa (mesmo eu não curtindo essa cor).
Contratamos obstetra particular para parto natural, doula, fotógrafa, fizemos ensaio da gestação todos os meses, fomos em todas as rodas de conversas de parto, fizemos curso de spinning baby para ajudar no parto, acompanhamento com outro GO, endócrino, psiquiatra e psicóloga. Estava amando saber como seria a tão famosa dor do parto, ter o bebê em seus braços e amamentar, era tudo que sonhava!
Foram dias e noites, vomitando em um balde roxo (meu fiel companheiro de cama), enjoos, azia, tonturas, sangramentos, pressão caindo, enfim... aquela gravidez que deixaria várias histórias para contar (e deixou mesmo). Até a 30ª semana, passei por duas internações e várias passagens pelo Pronto Socorro. Tive várias complicações na gestação. Meu exame da tireóide só aumentava, tinha muito sangramento e de repente veio a placenta prévia. Uma luta em orações para ela se mover "um cadinho" apenas, assim a médica tentaria o parto natural.
Com 32 semanas a placenta se moveu (Uhuuuuu), a médica falou que tentaria um parto natural, porém sangraria um pouco mais que o normal, o que pra mim não seria problema. Conversava tanto com a Helena (nossa paçoquinha – apelido carinhoso que demos a ela) dentro de mim. Todo momento passava a mão na barriga, era cada chute que a barriga ficava torta. O novo papai pirava com cada sensação nova. Passei o Natal com um barrigão (apesar de só ter engordado 2 quilos) e chegou o Ano Novo, com ele a história mudou também.
Dia 1 de janeiro de 2020 a noite, lá estava eu no hospital novamente com sangramento e muita dor. Médicos entravam e saíam do quarto verificando minha pressão (que sempre foi baixa) e de repente descobrimos a famosa pré-eclâmpsia. Como assim? Minha pressão sempre foi baixa..., mas sim, a realidade estava ali presente. Nesse momento já digo que não é legal ser da área da saúde (sou enfermeira), pois sabia tudo que podia ou não acontecer comigo e com a Helena. Fiquei internada até dia 4 de janeiro e nesse tempo fui muito furada, medicada e monitorada e quase Helena nasceu dia 2. A placenta já não poderia ser usada para fazer meus comprimidos por conta da medicação, o que já me deixou triste.
Quando tive alta, só queria curtir meu último mês de gestação, tomar um banho gostoso e dormir na minha cama, mas nem imaginava que na mesma noite do dia 4 já estava eu internada novamente, após sentir dores e muito sangramento. Ao menos tomei banho com direito a foto e consegui descansar na minha cama. Lembro que enquanto o novo papai me ajudava no banho falei "Helena está chegando" e ele riu falando que sim, mas só no próximo mês.
Na manhã do dia 5 a obstetra adentrou ao quarto com o aparelho de pressão, e a verificou, fez o exame de toque onde já estava com dois de dilatação e infelizmente sentindo minha placenta. Olhou para nós e disse “temos que fazer o parto da Helena”.
Foi aí que um buraco se abriu, tudo que tinha planejado não estava acontecendo. A obstetra nos informou que verificaria vaga na UTI Neonatal e que faria pedido de bolsa de sangue pois eu já tinha perdido muito, era tanta gente entrando no quarto me furando, tirando sangue e me medicando e o novo papai ligando para a doula e para a fotógrafa. Eu não tive mais noção de tempo.
A obstetra voltou ao quarto e disse que me esperava no centro cirúrgico. Após muito chorar, me lembro entrando na sala e o anestesista muito atencioso conversando comigo junto com a obstetra, a doula e a fotógrafa me acalmando. O novo papai entrou na sala com a cara assustada e sentou ao meu lado. Na verdade, não me lembro de muitas coisas desse momento, lembro da doula chamando o anestesista pois minha pressão arterial oscilava muito, vomitei demais também, mas de repente ouvi um choro bem forte e a obstetra me dando parabéns dizendo “a Helena é bem linda”. Nesse momento, o novo papai bem emocionado me deu um beijo e levantou em direção a neném, pois ela precisava ir para UTI. Além de ser prematura (34 semanas), pesava somente 1.715 quilos e media 41 centímetros, então o pediatra não pode trazer para eu conhecê-la e também não consegui ter a foto tão sonhada da nova família.
A cirurgia demorou muito, lembro da equipe contando as compressas, falando que estava sangrando muito, nesse momento vi um túnel muito iluminado ao fundo que eu poderia seguir, mas me segurei porque queria conhecer a Helena. Após me mandarem para o pós operatório, enjoada, desorientada e me sentindo muito sozinha, o tempo não passava e o anestesista me monitorava constantemente, pois minha pressão arterial estava oscilando muito. Quando cheguei ao quarto, faltava o mais importante, a Helena... Por mais que o novo papai demonstrasse força e me incentivasse, eu me sentia arrasada.
Ao entardecer, ele foi conhecer a Helena sozinho, pois eu não conseguia levantar da cama de tanto sangramento que tinha, ele me trouxe uma foto dela, falou como ela era, como estava, falou até que tinha um desenho em cima da incubadora com o nome dela, tudo isso com a voz embargada (provavelmente chorou sem eu ver), contudo, eu não acreditava que era ela. Quem me garantia que era a Helena e não outro bebê?
No dia seguinte ainda sem conhecer minha filha, tive que passar por outro processo cirúrgico pois não achavam mais acesso em minhas veias e tiveram que passar um acesso venoso central para poder fazer a transfusão de sangue, O que mais doía era não conhecer minha filha, não sentir o cheiro dela, não ter visto o primeiro xixi, o primeiro cocô, colocá-la em meu peito, enfim, não sabia nem como ela era. Nesse dia, pela segunda vez vi um túnel muito iluminado ao fundo que eu poderia seguir, mas novamente me segurei por não conhecer minha filha.
No dia 7 de janeiro, mesmo fraca, pude conhecer minha filha. Na verdade, a Helena veio me conhecer. A equipe da UTI Neonatal, muito gentil, a trouxe por volta das 16h no meu quarto. Aquele momento foi único, mágico e indescritível. Enfim, pude segurá-la em meus braços, sentir seu cheiro, seu coração batendo. Foi tão emocionante que toda equipe chorou. Foram poucos minutos, mas para mim foi suficiente para me conectar com ela.
Cada grama que ela ganhava era comemorado por nós, e não deixamos de visitá-la em nenhum dia, mesmo eu estando com complicações no pós parto. Fiquei internada por mais três dias, depois de dez dias de parir, pois havia algo em meu útero e quase precisei passar por uma nova cirurgia. Em um dia foram ao menos dez picadas para puncionar uma veia. Achei que ia morrer mesmo.
No dia 19 de janeiro pude amamentá-la pela primeira vez. Meu Deus, quase tive "um treco" quando o pediatra me autorizou a fazer isso. Não é nada fácil ter que pedir para segurar sua filha por alguns minutos durante a visita e muitas vezes ouvir um não.
Foram 30 dias dentro da UTI Neonatal, com muitos altos e baixos. Helena pegou infecção, tomou muita medicação, também teve que fazer transfusão de sangue, foi muito furada para realizar exames. Enfim, no dia 4 de fevereiro de 2020 fomos para o quarto ficar isoladas para que ela pudesse ganhar peso e no dia 7 a tão sonhada alta hospitalar para nosso lar. Nossa família agora estava completa!!!
Sei que parte de mim morreu naquele hospital, mas o dia a dia tem me recompensado com as atitudes da minha pequena guerreira chamada Helena Poli Silva.
(Relato da mamãe Haya enviado em 2021)