“A criança precisa se sentir amada e [saber] que alguém está lutando pela vida dela. O amor é tudo durante o cuidado com o prematuro”. Esse é o depoimento de Daniele de Toledo do Prado, de 35 anos. Moradora de Votorantim (SP), ela comemorou no sábado (8) o aniversário de um ano do filho, João Pedro, que nasceu com 24 semanas (cerca de seis meses). A data coincide com o mês em que se lembra o Dia Mundial da Prematuridade, celebrado nesta segunda-feira (17).
Com uma gravidez considerada de risco, Daniele deu à luz um casal de gêmeos no dia 8 de novembro de 2013, após passar mal e ter um sangramento. João Pedro e Maria Eduarda nasceram com 24 semanas. Ela com 630 gramas, morreu 13 dias após o parto. Já o menino, nascido com 515 gramas, sobreviveu. “Os médicos tentaram segurar o parto, mas não foi possível. Foi tudo muito rápido e desde o começo me disseram que eles não teriam chances de sobreviver”, diz a mãe ao afirmar que o pulmão da criança não estava desenvolvido devido ao pequeno tempo de gestação.
Para ela, os primeiros minutos na UTI neonatal foram de medo. “Jamais imaginei que iria passar por isso. A primeira vez que vi foi um choque, porque visivelmente a imagem da criança não é bonita. Chega a assustar porque era um mundo totalmente desconhecido para mim. Eu tinha muito medo de que ele não agüentasse.
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João ficou internado no hospital durante nove meses. (Foto: Arquivo pessoal/Daniele do Prado)
Aos 21 dias de vida, a criança teve a primeira complicação, quando os rins deixaram de funcionar. O bebê inchou, chegou a pesar 700 gramas e parou de se mexer. “Foi quando a médica falou para mim que ele estava há dois dias sem urinar e que novamente eu tinha que me preparar para o pior”. A melhora só se deu, segundo a mãe, após carregar o bebê pela primeira vez. “Eu pedi para os médicos e me responsabilizei por isso. Queria sentir o meu filho nos meu colo, já que não tinha feito isso com a Maria Eduarda. Eu carreguei, senti, fiz uma oração. Coloquei a mão dele no meu coração e disse que estava batendo por ele”. Após isto, Daniele conta que a criança começou a melhorar. “Já estávamos até com o caixão comprado para ele, mas foi aí que começou o milagre na nossa vida”, completa a mãe, que é evangélica.
O hospital começou a deixar a mãe participar mais da internação do filho, que acredita que isto foi fundamental para a melhora no quadro de João. “Algumas mães nem visitam os bebês. Crianças que nasceram com o dobro do peso do meu filho acabavam morrendo. Eu acredito que o amor de mãe é tudo. A criança não luta se não se sentir amada”, diz.
Devido ao problema de desenvolvimento dos pulmões, aos 4 meses, João teve uma parada cardiorrespiratória e precisou fazer uma traqueostomia. Em junho ele também fez uma gastrostomia, para não correr o risco de ir comida para o pulmão, e hoje se alimenta com a ajuda de um aparelho.
João tem acompanhamento com enfermeiras se alimenta com a ajuda de uma máquina. (Foto: Jomar Bellini / G1)
Após a alta de João, no mês de agosto, a família precisou reformar a casa e fazer adaptações para receber o home care. “Foi às 12h30 do dia 14. Eu lembro exatamente porque para mim foi como se ele tivesse nascido ali”. A sala do sobrado foi transformada em um quarto para a criança e mãe dormirem sem precisar subir escada. A garagem também foi derrubada e virou a sala da residência. “Nós mudamos toda a rotina da casa por causa dele, para receber as enfermeiras. Ele é a alegria da família e isto supera todas as dificuldades”, conta a avó Selma do Prado.
Hoje, Daniele vê o filho como um vencedor. Aos poucos eles vão tentando levar uma vida normal. Neste mês, além do aniversário, a família também comemorou o primeiro passeio do menino, que foi a um parque da cidade e à casa dos avôs. “Ele mostrou que é mais forte. Eu tenho orgulho de tudo o que passei e de lutar por ele”, diz a mãe.
Após nove meses internado, João Pedro comemorou um ano de vida em novembro.(Foto: Jomar Bellini / G1)
Canguru
De acordo com a pediatra Ana Paula Lima, o método é conhecido como “Canguru”, que é uma abordagem humanizada, com o contato pele a pele (posição canguru) precoce entre a mãe e o bebê. “O crescimento e desenvolvimento cerebral destes bebês continua fora do útero e não há incubadora mais perfeita que a barriga da mãe. Portanto a assistência a estes bebês deve ser diferenciada, minimizando estímulos sensoriais e valorizando individualmente suas características.”
Para o pediatra Rodrigo Zukauskas, que acompanhou o caso de João, a recuperação da criança está fortemente relacionada a este contato com a mãe. Segundo ele, a literatura científica possui diversos estudos mostrando a relação positiva entre espiritualidade, religiosidade e saúde.
“O nascimento de um prematuro é uma experiência muito marcante na vida de uma família, trazendo à luz diversas sensações e conflitos. Nestes momentos difíceis a espiritualidade e a religião são fundamentais para as famílias e para a equipe cuidadora. O sucesso do João, sua família e outras famílias de prematuros está intimamente ligada a este aspecto", diz o especialista.
Segundo Zukauskas, a prematuridade é principal causa da mortalidade e das morbidades neonatais e vem aumentando no país. No Estado de São Paulo, para cada mil crianças que nasceram vivas com menos de 37 semanas de gestação, em 2011, 81 morreram antes de completar um ano, segundo os dados mais recentes disponíveis pela Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade). O índice é maior em Sorocaba (SP), onde no mesmo período, ainda segundo o Seade, 100 crianças prematuras morreram para cada mil nascidas na região. Em Jundiaí (SP) a taxa cai para 65.
No Brasil, 340 mil bebês nasceram prematuros só em 2012, segundo dados do Sistema de Informações de Nascidos Vivos, do SUS e Ministério da Saúde. Isso significa que nascem 931 prematuros por dia ou 40 por hora, no Brasil, indicando uma taxa de prematuridade de 12,4%, o dobro do índice de alguns países europeus. “As chances de um bebê prematuro sobreviver variam muito em relação as vários fatores, como as ações no pré-natal, as condições de nascimento e a atuação da UTI Neonatal. Quanto menor é sua idade gestacional, maior é o risco”, afirma.
Fonte: G1 (Notícia original publicada em 17 de novembro de 2014, por Jomar Bellini, Do G1 Sorocaba e Jundiaí)