09 de Junho de 2013

Alexandre: o pequeno herói de 26 semanas

"Olá
Hoje tomei coragem para escrever.
Meu nome é Alessandra, tenho 34 anos, moro em Salvador e tenho um filho, Alexandre.
Engravidei sem planejar, com cinco semanas confirmei. Demorei para aceitar a idéia de que teria um filho sendo solteira e sem nenhum apoio do pai, mas ainda assim decidi ter meu filho. A partir daí começou minha luta.

Sou hipertensa mas sempre controlada. Contudo, nos três primeiros meses suspendi a medicação por indicação do meu GO, sentia dores de cabeça mas elas logo passaram. Meu obstetra me alertou que eu teria uma gravidez que precisaria de atenção especial e, quando completei três meses, voltei a tomar anti hipertensivo, a metildopa de oito em oito horas de 250mg. Iniciei uma dieta sem sódio e nada de excessos, pois eu não podia engordar. Meu pré natal começou de 15 em 15 dias, pois meu médico era também meu ginecologista e me conhecia há tempo. Fazia exames laboratoriais com freqüência e tudo estava normal, com exceção de minhas plaquetas que, mesmo tomando antianêmico, teimavam em cair. Até então eu só estava alerta, mas ainda não preocupada.

O que tirou minha paz foi descobrir que minha pressão, mesmo com medicamento, não estava baixando, mas sim subindo. Estava inchando muito aos quatro meses. Fiquei muito apreensiva e com medo. Foram exames e mais exames, remédios, até que aos cinco meses o médico pediu que, por precaução, eu procurasse uma emergência obstétrica. Chorei muito, pois mesmo mostrando que Alexandre estava bem nas ultrassonografias, o médico me chamou atenção que, por conta da minha pressão, eu poderia ter meu filho prematuro e com baixo peso.

Fiz preventivo e tudo bem, mas a pressão não. Comecei no final dos cinco meses a sentir dores nas costas e muita insônia. Meus dedos, mãos e rosto estavam muito inchados, em um mês me descontrolei e engordei 4kg. Acordava mal, fui ao médico e ele me afastou do trabalho e pediu novos exames. Até que numa sexta-feira treze, mesmo dia da minha consulta e após uma noite mal dormida, acordei com um leve sangramento. Fui ao consultório com o resultado dos meus exames, o médico me examinou e disse que eu estava com pré eclâmpsia e deveria urgentemente ir a uma emergência obstétrica a fim de ser monitorada.

Chegando no hospital minha pressão estava em 23/18 e a equipe obstétrica, depois de realizar exames laboratoriais, me informou que eu estava com uma crise de Síndrome de Hellp e que, de acordo com o protocolo médico, iriam interromper minha gestação. Eu não fazia idéia do que significava e implorei que não fizessem isso em prantos, desesperada, pois eu estava apenas com 26 semanas de gestação e as chances dele sobreviver eram poucas. Implorei várias vezes segurando minha barriga, até que a médica de plantão disse que meus órgãos não resistiriam nem mais uma hora e que a prioridade era salvar a minha vida, pois todas as minhas taxas estavam alteradas perigosamente. Perguntei a ela se meu filho nasceria morto e ela disse que estava ouvindo os batimentos cardíacos, então ele estava vivo, mas que seria levado para a UTI.

Entrei em crise, meu filho começou a se movimentar como nunca e minha barriga endureceu, ele se estirou de uma forma que senti uma dor muito forte. Tomei uma dose de corticóide e aguardei uns 40 min, durante esse tempo eu chorei compulsivamente, não conseguia me controlar e fui para a sala de parto às 23h. Tremia como uma batedeira, mas estava consciente e falava para mim mesma que eu deveria me acalmar a fim de ajudar na chegada de Alexandre. A médica tentava me acalmar e dizia que eu poderia ter outros filhos, mas eu disse que não queria perdê-lo e ela me acalentava. Fiquei tremendo tanto que a anestesista só conseguiu aplicar a anestesia na terceira tentativa. 

Durante o parto ouvi a médica falando para outro médico que minha placenta estava descolando. Quando estava quase sem esperança, ouvi o choro do meu filho. Senti como se alguém estivesse me chamando de volta, ouvi pela primeira vez a voz do meu filhote. Uma grande emoção tomou conta de mim, chorei muito! Só lembro de ver a neonatologista que havia conversado comigo antes do parto com um plástico na mão levando ele. Mal pude vê-lo, não senti sua pele, não pude beijá-lo nem acariciá-lo.

Não dormi mais, tive hemorragia nos dois olhos, fui para a UTI, minha pressão não baixou, minhas taxas também não. Fiquei agoniada, precisava vê-lo. Não dormi até a neonatologista do dia seguinte ir ao meu leito me avisar que meu filho estava na UTIN recebendo cuidados, pesava 720g, media 35cm e estava bem grave. Chorei de novo e ela me pediu que acreditasse em Deus, mas que pusesse meus pés no chão. Não sou uma pessoa ignorante, tampouco sem esclarecimento, mas juro que só registrei que ele estava vivo.

Na UTI, pedia para toda equipe e médicos para ver meu filho, pedia à minha mãe também que eu fosse visitá-lo, mas a psicóloga não havia autorizado. Só me diziam que ele estava estável e eu só pensava no pior, meus seios encheram de leite e empedraram! Sentia dores horríveis, nenhuma compressa dava jeito, até que uma obstetra veio com uma seringa e disse que iria tirar o leite empedrado. Ahhhh... que dor! Até que, depois de três dias, fui para o quarto e fui liberada para ver Alexandre!


Foi um momento mágico mesmo! Um misto de alegria, surpresa, admiração, medo, angústia... Estava diante do meu filho, numa situação que NUNCA tinha imaginado, nem nos meus piores prognósticos, mas ainda assim meus olhos enxergavam apenas o milagre da vida. Eu o olhava com tanta admiração, com tanto amor, que eu jamais tinha sentido em toda minha gravidez. Olhava aquele grãozinho mais lindo do mundo, cheio de cateteres, olhos vendados, cabeça enrolada e quietinho. Ele já fazia parte de mim e da minha vida, soube ali que a nossa luta estava começando. Chorei.

Eu havia desenhado em minha imaginação um parto programado, com direito a foto com meu filho no braço, amamentá-lo, etc. Mas vi que o mais importante era que ele estivesse vivo e sem sofrimento, independente de qualquer coisa, abriria mão de tudo pois esse tudo seria dispensável: lembrancinhas, foto da porta, malinha etc. Meu filho não. Queria que seu pulmãozinho prematuro conseguisse respirar, que os vasos de seus olhinhos não rompessem, que seus rins conseguissem filtrar e que seu cérebro terminasse de se formar.

Perguntei se ele sentia dor e a médica disse que ele estava sedado. Perguntei se podia amamentar, não podia pois ele perderia mais peso (perdeu 120g). Comecei a perguntar às enfermeiras e técnicas se existiam casos como o meu (achava eu, na minha ignorância, que não existiam casos assim) e, se sim, se os bebês ficavam bem. Elas me diziam que não era incomum e que viam sempre esses casos por lá. Eu nem sabia ao certo o que perguntar, me sentia uma ignorante e a médica, vendo minha falta de chão, pediu para que eu procurasse na internet o significado das palavras "prematuro extremo". Cheguei em casa e pesquisei, foi aí que encontrei o Prematuridade.com e comecei a ler e me informar sobre meu filho, e digo com muita verdade que me ajudou muito. Comecei a me sentir em condições de dialogar sobre as necessidades, procedimentos e condutas a serem adotadas para ele, o conhecimento sobre o assunto nos deixa mais fortes. Foi então que saí da caverna em que me encontrava.

Alexandre ficou dez dias em dieta zero. Ele rejeitou por duas vezes a dieta, seu estômago distendeu e ele começou a regurgitar uma substância verde, depois mais escura, e fiquei com medo que fosse enterocolite. Na terceira ele finalmente aceitou 1ml de leite, foi a nossa primeira vitória! Aos poucos foi ganhando ora 20g, ora 40g, tudo comemorado ao extremo! Comecei a ordenhar meu leite. Depois ele apresentou sepse tardia, icterícia tardia, nos dias que ele coletava sangue para exames eu não dormia pois ficava com medo do resultado. Nos dias de transfusões eu sempre estava presente e acompanhava até o final, cada agulhada que ele recebia eu segurava meu ímpeto sempre vislumbrando sua melhora. Quando ele saiu da entubação para o CPAP eu chorei de alegria, mas a médica tratou de me alertar que ele poderia a qualquer momento voltar para o tubo, mesmo assim minha alegria não foi menor! Depois de seis dias ele saiu do CPAP, vibrei, a médica voltou com as mesmas observações. Eu sempre considerava essa possibilidade de volta e conversava com ele que, se ficasse difícil a respiração, a mamãe não ficaria triste em vê-lo com o respirador, pois eu estaria ali sempre ao seu lado e esperaria o "seu" momento e não o meu. Eu cantava canções de ninar (canto até hoje as mesmas), contava meu dia, os beijos dos amigos e familiares. A cada mês que passava no hospital, eu levava um bolo para comemorar com a equipe, e no segundo mês levava lembrancinhas para todos os bebês da UTIN, era meu modo de me manter saudável.

 

Fiz canguru, que alegria!! Senti a respiração e seu coraçãozinho junto ao meu. Trocava suas fraldas, dava a dietinha dele, primeiro na sonda e depois na mamadeira. A vida de mãe de UTI foi o momento mais difícil da minha vida. Não sei o que é resguardo, nos primeiros dias eu chorava muito, passei várias noites em claro. Todas as manhãs, na porta da UTI, eu chorava de medo. Tinha dias que dirigia tremendo na ida e na volta, sentia falta da minha barriga, via as mães saindo com seus filhinhos no colo e sentia uma inveja... Queria que as médicas me dessem um prognóstico, até que deixei de pensar no amanhã e passei a me ocupar só com o hoje, caso contrário ficaria louca de vez. Às vezes sentia vontade de sair correndo daquele lugar, tinha dias que eu só recebia notícias ruins, e as pessoas ligando querendo saber dele. Sei o que é fundo do poço, pois passei por tudo sozinha fisicamente, só Deus estava ao meu lado.

Alexandre ainda fez uma cirurgia de hérnia inguinal quando pesou 2kg, teve uma broncoreatividade e voltou ao CPAP. Tive uma crise de choro, isso um dia antes do meu aniversário. Após doses de berotec e adrenalina ele se recuperou e, depois de noventa dias, pude enfim levar meu filho para casa. Hoje meu filhote faz estimulação precoce, é acompanhado por uma pediatra neonatologista, neuropediatra, está com oito meses de vida e sete quilos e quatrocentos. Está super esperto e saudável e em breve tomará a Palivizumabe, pois solicitei em processo junto ao Estado.


Obrigada Deus por estar incondicionalmente ao meu lado, minha família por me dar suporte durante os noventa dias, e a equipe de profissionais que ajudaram e cuidaram do meu filho com carinho. Eu não esquecerei vocês."

Alessandra, mãe do Alexandre

Responsabilidade do conteúdo por conta do autor, não reflete o posicionamento da ONG. Não nos responsabilizamos pela veracidade dos fatos.

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