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02.09.2014

A superação dos prematuros Gael e Kenay


Notícia original publicada em 31 de agosto de 2014.

por Daniela Penha

[caption id="attachment_14870" align="alignright" width="300"]Nasceu com 480 gramas, no 5 º mês de gestação. A mão era do tamanho de uma unha. Teve paradas cardíacas e até os três meses enfrentou três cirurgias. (Foto: Jornal A Cidade) Nasceu com 480 gramas, no 5 º mês de gestação. A mão era do tamanho de uma unha. Teve paradas cardíacas e até os três meses enfrentou três cirurgias. (Foto: Jornal A Cidade)[/caption]

Gael não reclama quando a mãe o acorda para as fotos da reportagem. Sai correndo, atrás dos carros e caminhões, brinquedos preferidos. Depois pega a bola e em poucos minutos é ele quem chama a fotógrafa, puxando pela mão. Faz pose, quer mostrar ao mundo sua vitória. No colo da mãe, se derrete. Beija, abraça e cai na gargalhada quando ela imita a formiguinha com os dedos.

Quando olha para ele, Cynthia Marchini entende que todo esforço vale a pena. “Eu tenho orgulho dele. Foi um guerreirinho”. Não é a única. Ver os pequenos ganharem o mundo é o que motiva a equipe da unidade neonatal. “A gente tira força dessas histórias. É gratificante entregar um bebê nos braços da mãe para que ela leve embora”, nas palavras da chefe de enfermagem Cristina Dalri.
Gael é lembrado na unidade neonatal pela sua força. “Ele lutou muito”, Cristina não se esquece. Força tanta que parecia não caber em 480 gramas. Foi com esse peso que o menino veio ao mundo, no 5º mês de gestação. A mãe teve um quadro de pressão alta e a bolsa estourou antes da hora. “Fizeram uma cesárea de urgência”, relembra.

Com uma semana de vida, ele teve duas paradas cardiorrespiratórias e precisou drenar os pulmões. Com 15 dias, fez uma cirurgia cardíaca. Com um mês, passou por procedimento nos olhos e aos dois meses quebrou o bracinho, que era frágil demais. Em um procedimento comum na unidade, o osso sofreu fratura. Aos três meses, ele passou por uma cirurgia de hérnia. “Ele enfrentou muita coisa. Dava desespero. Tão pequenininho...”.

A mãe aprendeu a acreditar na força do pequeno. Quando Gael teve alta, com cinco meses, ele ainda precisava do balão de oxigênio para respirar. Era 20 de dezembro. “Eu não queria passar o Natal longe dos meus filhos. Teria que escolher entre ele e os outros dois. Insistia todo dia pela alta”.

Cynthia tem dois filhos mais velhos que Gael. Hoje, Gabriel tem 10 anos e Graziele, 9. Para ficar com o caçula na UTI, ela se desdobrava. Levava os dois na escola às 13h e ia para o HC. Saia de lá às 17h para buscar a dupla. Levava os dois para casa e voltava para o hospital. “Eu precisava levar leite para ele”.

Quando a médica deixou que a família passasse o Natal com o pequeno, a alegria teve pitadas de medo. “Eu achava que não ia conseguir cuidar dele, que ele ia morrer na minha mão”. A casa ganhou um pouco de hospital. Gael não podia ficar sem o balão e estava sempre ficando doente. “Eu achava que nunca ia passar”.

Passou. Depois do primeiro aninho, comemorado com muita festa, a resistência do menino melhorou, as internações ficaram menos constantes e logo vieram os primeiros passinhos. Hoje, com dois anos, as conquistas são tantas que apagam a tristeza. “Depois de tudo o que ele passou, a sonda não é nada”.

Ele ainda usa uma sonda para a ingestão de líquidos. Como os pulmões são frágeis, ele aspirava o que tomava com frequência. Parece, porém, nem sentir o fio colado na face.

Risonho e serelepe, não para um minuto. Se cai, não chora. Levanta logo. Não pode perder tempo. Ainda não consegue falar, porque uma das cordas vocais está paralisada. Mas tenta. Com rouquidão, faz sons e chama a atenção:“Papaaaa”, vai tentando. A mãe resume: “Ele é uma vitória. É quem faz todo mundo sorrir”.

Conquista em pequenas doses

[caption id="attachment_14871" align="alignleft" width="300"]A equipe e as mães se tornam amigas dentro da UTI do HC, na luta pela vida. (Foto: Lucas Mamede/Especial) A equipe e as mães se tornam amigas dentro da UTI do HC, na luta pela vida. (Foto: Lucas Mamede/Especial)[/caption]

Pais que ninam seus bebês na UTI têm muito a comemorar antes do primeiro passo. Cada melhora é uma grande conquista.

As alegrias não são só a primeira gargalhada, a primeira palavra, a primeira gracinha. Antes dessas, há outras muitas barreiras que um recém-nascido de alto risco precisa derrubar. “É um jeito de ser mãe diferente. Elas vivem e comemoram um dia de cada vez”, explica a psicóloga Ana Cláudia Castro.

Um remédio a menos, o dia em que o bebê respirou sem aparelhos, cada grama a mais na balança, a primeira mamada, deixar a incubadora, a transferência da UTI para a intermediária, a cirurgia de alto risco que deu certo. São muitas as batalhas desses seres que já nascem lutando pela vida.

A equipe da unidade neonatal ensina a mãe a conhecer o seu bebê e a lidar com ele durante todo esse período. A ideia é que todos possam ir para o colo, mas, nos primeiros dias de vida, ainda não é possível esse contato e, então, outros tipos de afeto são criados. “A gente ensina a ser mãe de um jeito diferente do convencional. Não dá para pegar no colo, mas dá para conversar, tocar, ler um livrinho”, explica Ana Cláudia.

Quando os bebês ficam maiores, a terapeuta Sheila ensina as mães a fazerem massagens relaxantes. “A ideia é que elas se sintam o mais próximo possível do ambiente de casa”.

Conheça Kenay, este outro bravo lutador

Kenay nasceu com 610 gramas, na 24ª semana de gestação. Com uma semana de vida, passou por uma cirurgia de alto risco.

A mãe, Amanda Bernardo Borges, sofreu cada minuto. “A gente aprende a dar um valor que não dava a cada coisa”.

A alta veio depois de 85 dias no hospital. “Todo dia eu conversava com ele: ‘Fica bom logo pra ir para casa. Var dar tudo certo’”, dizia.

Levar para casa, porém, também é desafio. Antes de deixar o hospital, as mães são treinadas para cuidar dos pequenos e o vínculo com a equipe não termina.

Kenay está com um aninho. Quer andar, chama a mãe, fala pai, come de tudo. “Está aprendendo as coisas no tempo dele”, nas palavras da mãe.

Pelo menos duas vezes por semana, passa por atendimento no HC. “Ele tem consultas com pediatra, endócrino, oftalmologista, fisioterapeuta: tudo o que precisa”, diz a mãe.

Em casa, os cuidados também são intensos. Amanda parou de trabalhar e presta atenção a cada sinal de Kenay. “Eu decidi cuidar do meu filho. É tudo para ele. Ficamos juntos o dia todo, sem desgrudar”. Assim como era no tempo de hospital, a rotina é viver cada dia, comemorando cada conquista. Agora, a expectativa é, finalmente, pelos primeiros passos. “A gente tem que aprender a entender o tempo dele”. A mãe já aprendeu a não ter pressa.

É como na UTI. Tudo a seu tempo. Nas datas comemorativas, há festa. Papai-noel distribui presentes na noite de Natal. Mamães ganham dia em maio e papais recebem homenagens em agosto.

“O contato entre pais e bebê não atrapalha, não aumenta a contaminação. Eles vão se tornar pais de acordo com as possibilidades do bebê”, frisa a médica Walusa.

A alta é um dos pontos finais dessa trajetória. Depois dela, porém, um novo ciclo recomeça. Como no caso de Kenay e Gael.

Fonte: Jornal A Cidade

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