A prematuridade é alvo de campanha mundial nos meses de novembro para alertar sobre os riscos e a possibilidade de evitá-la.
Contar os dias, as semanas e os meses faz parte da rotina de uma gestante. Enquanto anseiam pela celeridade do tempo, para, enfim, terem seus bebês nos braços, paradoxalmente celebram cada segundo em que o filho permanece no ventre, reduzindo os riscos e as sequelas que a prematuridade pode ocasionar. Entre 2019 e 2021, o Brasil registrou o nascimento de 8,251 milhões de bebês prematuros, aqueles que nascem antes das 37 semanas de gestação ou com aproximadamente 8 meses, conforme dados do Ministério da Saúde.
Esse número coloca o país na décima posição em números absolutos de partos prematuros no mundo, de acordo com dados coletados pela Associação Brasileira de Pais e Familiares de Bebês Prematuros (ONG Prematuridade).
Em Minas Gerais, a Secretaria de Estado de Saúde aponta que os partos prematuros ocorreram em 11% dos nascimentos, entre janeiro de 2021 e setembro de 2022. Segundo especialistas, quanto mais elevada a prematuridade do parto, maiores os riscos para o bebê e menores as chances de sobrevivência. Situação que se reflete na triste estatística: no Estado, dos 4.421 óbitos em menores de 1 ano no período, 57,9% das mortes, um total de 2.564 óbitos, correspondem a bebês que nasceram antes do tempo previsto.
Já em Belo Horizonte, dos 4.358 prematuros que nasceram nesse mesmo período, 259 não resistiram à prematuridade. Ou seja, 5,94% dos bebês nascidos antes do tempo morreram, segundo dados da Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte. A gravidade e a frequência da situação motivaram a criação da campanha mundial Novembro Roxo para sensibilização sobre a prematuridade. A cor roxa foi escolhida por simbolizar a sensibilidade e a individualidade, que são características desses bebês.
Sequelas da prematuridade
A advogada Priscila Ramos, 44, conhece bem a dor de perder um filho por causa das sequelas deixadas pela prematuridade. Em novembro de 2018, após um quadro de pré-eclâmpsia, ela foi submetida a uma cesariana de emergência e deu à luz o primogênito Pedro Luís, com apenas 25 semanas de gestação. Com 415 g e medindo 29 cm, ele era um prematuro extremo. “Nós ficamos na UTI Neonatal por 235 dias”, relembra a mãe.
Priscila conta que durante um ano e meio, Pedro Luís foi um bebê ativo, esperto e muito amado. Na casa da família, álbuns de fotos com memórias da gravidez, do parto e da festa do primeiro aniversário ainda estão na prateleira da sala. “Infelizmente, ele partiu por complicações respiratórias”, conta. O menino morreu em 12 de maio de 2020, dois dias depois do primeiro Dia das Mães de Priscila fora do hospital.
Segundo a coordenadora da UTI Neonatal do Hospital Vila da Serra, Maria Lúcia Pessoa de Castro, em alguns casos, nascer antes do tempo previsto pode implicar em diversas sequelas até a fase adulta. Além de distúrbios respiratórios e infecções, o prematuro corre risco de desenvolver problemas metabólicos, neurológicos e cognitivos.
Advogada enfrentrou drama duas vezes
Dois anos após perder o primeiro filho por sequelas da prematuridade, a advogada Priscila Ramos, 44, voltou a enfrentar o drama de dar à luz antes do previsto, em julho deste ano. Grávida de gêmeos, ela enfrentou uma gravidez de risco, que resultou em um parto na 34ª semana de gestação. Um dos bebês, porém, já estava morto desde a 31ª semana.
O outro gêmeo, João Pedro, nasceu com 2.090 kg e 41 cm. “Nasceu bem, forte e saudável, mas, devido à prematuridade e pelo desconforto respiratório, já que o pulmãozinho ainda não estava completamente formado, ele teve síndrome da membrana hialina, tendo que ser intubado para fazer uso de corticoide até amadurecer o pulmão”, explica a mãe.
Priscila conta que as complicações durante a gravidez já eram esperadas. “Minha gestação era de alto risco por conta do meu histórico anterior de pré-eclâmpsia grave, crescimento fetal restrito grau 4 com nascimento prematuro, pré-diabetes, hipotireoidismo, hipertensão arterial crônica”, revela. Além disso, os médicos detectaram uma insuficiência placentária, fator que contribuiu para que um dos gêmeos, que se chamaria Davi Luís, morresse ainda na barriga da mãe.
Pouco mais de três meses após o parto, a advogada celebra o fato de João Pedro estar bem e saudável.
Em alguns casos, nascer antes do tempo previsto pode implicar diversas sequelas que influenciam a vida da pessoa desde bebê até a fase adulta. Segundo a coordenadora da UTI Neonatal do Hospital Vila da Serra, Maria Lúcia Pessoa de Castro, além de distúrbios respiratórios e infecções, o prematuro corre risco de desenvolver problemas metabólicos, neurológicos e cognitivos.
“A displasia broncopulmonar, por exemplo, leva à uma dependência de oxigênio e de ventilação mecânica na UTI e, após a alta, há um maior risco de complicações respiratórias, como sibilâncias (ruídos durante a respiração), infecções respiratórias e pneumonias. Já as hemorragias intracranianas e algumas lesões cerebrais podem ocasionar déficits cognitivos e de desenvolvimento e paralisia cerebral. Além disso, os riscos também envolvem a retinopatia da prematuridade, que é uma doença que pode levar desde a problemas visuais até a cegueira. Pode haver também atrasos de linguagem e desenvolvimento de distúrbios como TDAH e autismo, além de distúrbios de crescimento”, afirma a especialista.
Classificações de parto prematuro
São considerados partos prematuros aqueles que antecedem as 37 semanas de gestação, o equivalente a 8 meses, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Entretanto, a prematuridade é classificada de acordo com o tempo em que o bebê permanece no útero. Os prematuros extremos são aqueles bebês que nascem antes das 28 semanas (6 meses). Muito prematuros são os que nascem entre 28 e 31 semanas (7 meses), enquanto os prematuros moderados são aqueles que nascem entre 32 e 36 semanas de gestação (8 meses).
Rede de apoio para família prematura
Os três filhos de Priscila nasceram na maternidade e por lá ficaram por longos períodos. As idas dela e do marido à UTIN sempre que fossem permitidas fizeram com que a família criasse laços para além dos feitos com seus bebês recém-nascidos. Equipes de médicos e enfermeiros, além de outras mães e pais de prematuros, formaram uma rede de apoio para que momentos tristes e felizes fossem compartilhados.
“Tinha uma enfermeira que dava um pulo de alegria a cada bebê que recebia alta. Como acompanhei muitas histórias, resolvi criar um grupo chamado Pulinhos de Alegria e compartilhar relatos, histórias e informações. Hoje, nosso grupo se chama Mães de Prematuros, no Instagram e no WhatsApp. Somos uma família”, relata.
De acordo com o coordenador da equipe médica neonatal da Maternidade Hilda Brandão, da Santa Casa BH, José Mariano Sales Alves Júnior, esse cuidado com o núcleo familiar é fundamental para a sobrevida do bebê, com qualidade e saúde. “A relação com os pais e a participação deles no cuidado com o prematuro é fundamental. Os pais desempenham um papel no cuidado, no aprendizado especialmente em amamentar. Aqui, praticamos o chamado ‘método canguru’, que é o cuidado no colo que permite já no CTI que a mamãe e o papai fiquem com os bebês no contato pele a pele, e isso ajuda na recuperação desses nenéns, dando a eles segurança e entrosamento” pontua.
Fonte: O Tempo