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26.03.2019

Entrevista com a Dra. Rita C. Silveira

A Prematuridade.com entrevistou a Dra. Rita C. Silveira, Doutora em Saúde da Criança e do Adolescente pela UFRGS, Professora do Departamento de Pediatria da UFRGS, Chefe da UTI Neonatal do Hospital de Clínicas em Porto Alegre, Coordenadora do Ambulatório de Neonatologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e Chefe do programa de Follow Up.

1. Como a Sra. vê o cenário nacional e mundial quanto a prematuridade hoje?

O número de prematuros sobreviventes aumenta ano a ano. A maior sobrevida de prematuros, cada vez com menores idades gestacionais, é devido à melhora dos cuidados nas Unidades de Tratamento Intensivo Neonatal do mundo de forma geral. No Brasil, ainda existe um longo caminho a ser percorrido, mas temos tido também prematuros menores sobrevivendo, tão imaturos quanto 24 semanas de gestação. Ficam internados, não raramente, por dois a três meses até a tão esperada alta hospitalar.

2. Como a Sra. vê essa questão do não atendimento através de ambulatórios de seguimento e quais são as alternativas que a gente pode encontrar para aquelas crianças que não conseguem se colocar em um ambulatório de seguimento, que muitas vezes tem uma atenção toda voltada para o serviço privado e acaba saindo sem um ambulatório de seguimento de referência. Como isso deve ser feito?

A atenção ao prematuro nos consultórios pediátricos é muito desafiadora para o pediatra. Ele é multitarefas: precisa avaliar crescimento, desenvolvimento, conhecer as morbidades mais frequentes e manejá-las adequadamente. O entendimento da dinâmica e da organização familiar é fundamental nas orientações. Assim, numa consulta de puericultura normal é impossível!!! O certo era ter consultorias de apoio ao colega, para que esse possa focar nas questões pediátricas e gerenciar a situação da melhor maneira, priorizando as necessidades da criança e da família. O seguimento ambulatorial institucional é mais fácil porque a equipe multidisciplinar apoia e é parceira no atendimento das necessidades múltiplas associadas ao nascimento prematuro.

3. Quais são os efeitos positivos do ambulatório de seguimento na vida dessa criança e também na vida adulta, as repercussões desse atendimento em ambulatório de seguimento?

Um adequado acompanhamento permite o diagnóstico precoce dos problemas e a prevenção de doenças crônicas do adulto. O prematuro tem maior risco para Síndrome Metabólica, Doença Coronariana, Hipertensão Arterial, doenças pulmonares... às vezes em fases bem precoce da adolescência. Na idade escolar apresentam diversos problemas cognitivos e comportamentais que, se manejados no momento adequado, poderão ser minimizados, resultando em melhor aprendizagem e adultos mais capazes.

4. Como se dá o acompanhamento dentro dos ambulatórios de seguimento e quais as equipes que atendem esse prematuro?

Puxa vida... aqui teria que falar muita coisa. Prefiro nem começar porque seria motivo de uma entrevista somente sobre esse tema, ok?

5. Existe algum espaço para a família no ambulatório de segmento. Como é feito isso, da questão da família sendo empoderada do cuidado do recém-nascido prematuro. Como é feito para que haja essa aproximação da família do recém-nascido e da continuação desse cuidado?

É fundamental a família estar envolvida no cuidado. Cada vez mais evidências científicas provam que o melhor cuidado é o individualizado centrado na família. Existem vários modelos desse cuidado, de como engajar a família e orientar a mãe, o pai e cuidador principal na estimulação precoce da criança prematura. Na verdade, qualquer criança com dificuldades se beneficia desse tipo de abordagem. Temos trabalhado nisso, tanto que sou a investigadora/pesquisadora principal num projeto apoiado pela Fundação Bill e Melinda Gates e DECIT exatamente para orientação aos pais de como estimular a criança. Em cada etapa do desenvolvimento, atividades específicas, antecipatórias das aquisições esperadas, para que atinja um potencial de evolução na motricidade e na cognição desde a UTI. As intervenções cognitivas são mais complexas e tem menor sustentabilidade que as motoras. A longa permanência na UTI Neonatal promove uma ruptura das possibilidades da criança se desenvolver no seu melhor momento e um programa de intervenção precoce, iniciado quando a criança ainda está internada no hospital e continuado após a alta, pode melhorar vínculos, conferir segurança e tranquilidade aos pais, o que impacta após a alta também. Inserir atividades de leitura desde cedo, brincadeiras, conversas e muita, mas muita, atividade cotidiana, aproveitando cada momento que a criança está desperta.

6. Quando esse acompanhamento como um todo não é feito dentro do ambulatório de seguimento e sim de forma fragmentada no segmento privado, como os pais podem garantir que ele seja feito de forma integral?

Os pais com frequência sofrem uma sobrecarga de agendas, vários profissionais e ninguém gerencia a criança. É papel do pediatra esse gerenciamento, e/ou consultores especialistas em seguimento (praticamente inexistes no Brasil), que definirão as prioridades daquela criança para não gerar stress e minimizar os custos de vários profissionais. Por exemplo, em determinado momento a aquisição motora oral para alimentação é fundamental, assim como o sustento cefálico. Em outro momento é mais necessário a linguagem e a motricidade ampla. Ou quem sabe melhorar o sono? Ou minimizar as apneias do sono? Mais tarde, aspectos de atenção e execução de tarefas, aquisição de habilidades cognitivas... A escolha de cada necessidade passa por criteriosa avaliação médica, respeitando a etapa evolutiva da criança. Essa avaliação sistematizada pode ser realizada em momentos determinados (a cada seis meses). Lembrando sempre que se a criança está com qualquer quadro viral, já não é candidata a esse tipo de avaliação, devendo esperar o melhor momento para tal. A ideia sempre é permitir que a criança nascida prematura possa, tanto quanto possível, alcançar aquela que nasceu ao termo e sem morbidades. Sobreviver à UTI Neonatal não é o mesmo que sobreviver sem sequelas, mas devemos buscar um resultado favorável sem perder a janela de oportunidade dos primeiros anos de vida.

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