19 de Janeiro de 2023

Maria Helena, a guerreira da UTI

Nossa história começa muito antes de eu sonhar em engravidar da minha princesa. Em janeiro de 2019 estava agendado uma histerossalpingografia, pois havia desconfianças de que eu era estéril. Chegando no dia do exame, fui impedida de fazer pois havia tido um sangramento próximo à data. Na mesma época utilizava um anticoncepcional para tratar um cisto de Naboth no colo do útero e para refazer o exame de esterilidade, eu precisava fazer um Beta HCG. Ao sair da clínica, levei um tombo em uma pedra na calçada e torci o pé. Não aguentava me mexer, meu tornozelo doía demais e precisei engessar a perna. Logo depois fui pegar o resultado e foi onde levei um enorme susto… Eu estava grávida. Me tremia da cabeça aos pés. Como eu estaria grávida fazendo uso de medicamento contraceptivo?!

E foram mais acontecimentos… No dia seguinte acordei com muita dor no corpo e uma febre de 39°, sem saber o que havia acontecido, minha mãe me levou para o hospital e cheguei lá com perda de sentidos devido a dor e a febre altíssima. Fiz exames e foi identificado que eu tinha sido picada pelo mosquito Chikungunya, minha preocupação ali era enorme, pois eu estava grávida de poucas semanas. No mesmo mês, o pai da minha filha descobriu que estava com sífilis, todos ficamos preocupados, mas realizei os exames e deu tudo normal. Mais um alívio!

E não parou por aí, com 3 meses de gestação ele terminou nosso relacionamento. Passei a ser mãe solteira! Conturbada com tudo que estava passando, marquei psicólogo para me ajudar a lidar com minha vida. Dia 6 de agosto de 2019, a consulta estava marcada com o psicólogo às 8h da manhã e o pré Natal de alto risco às 10h. Entrei no consultório, desabafei e conversei sobre um cansaço que eu estava sentindo. Logo em seguida ela foi ouvir o coração da minha bebê e disse que estava tudo bem. Mediu minha pressão e viu que estava 17 X 10, me falou que era muito perigoso pressão alta, pois faltava oxigênio para o bebê.

Eu comecei a chorar feito criança, me encontrava muito sensível. A médica me levou para uma sala de observação e aplicou injeções em mim para abaixar a pressão, continuei deitada por horas e a pressão não baixava por nada. As vezes eu tornava a chorar com pena de mim e da minha bebê. Às 16h da tarde, já haviam aplicado 3 doses de medicamentos sem sucesso e resolveram chamar a ambulância da Cegonha. Fui levada ao hospital e fui internada, passei 1 semana tomando medicações, mas nada resolvia.

Chegou o dia 14 de agosto de 2019, o dia que eu iria renascer junto com minha bebê e não sabia. Fui levada pelo maqueiro para fazer uma ultrassonografia e pelas expressões da médica, as coisas não iam bem! A médica olhou pra mim muito séria e tensa com a situação, enquanto minha mãe estava com os olhos muito vermelhos de choro. Então a Doutora falou: "Nathália, nós vamos te operar e eu vou salvar a sua vida! Filho, você tem outro depois! Sua bebê já está sofrendo, ela perdeu 90 gramas de ontem para hoje e isso é muito!" Eu: “Não faça isso! Salva a minha filha e não a minha vida! Ela é a razão da minha vida, doutora!” Ela: “E você é a razão da vida dela”, e apontou para minha mãe. Foi um momento muito emocionante, não sei explicar tudo que senti.

Passou um filme em minha cabeça, tudo que eu havia passado e eu só achava que tinha chegado o meu fim. Fui levada às pressas para o centro cirúrgico às 14:45. Falei com minha barriga: “Filha, sobreviva!!! Porque você é minha filha!” Do nada me veio uma calma dos céus, a paz pairava naquele local. De repente ouvi um choro, era minha filha nascendo às 14:59. Olhei muito rápido e ela já estava dentro de uma incubadora, eles estavam com pressa de levá-la para a UTI.

Pude ver minha filha no dia seguinte, ainda com muitas dores da cesária, fui caminhando lentamente. Quando entrei na UTI Neonatal eu tremia descontroladamente e só conseguia chorar igual uma criança. Nunca tinha tido uma experiência como aquela! Devido ao meu desespero, deixaram minha mãe entrar comigo. Olhei minha filha frágil, muito pequenina, com tom de pele avermelhada, cheia de fios e tubos. Foi a maior dor que senti em toda minha vida.

Perguntei à médica de plantão se Maria Helena estava bem. Ela bem séria me respondeu: "Se estivesse bem, ela estaria com você em casa!” Naquele momento desabei, voltei para o quarto e só chorava e chorava. Não dormi, passei a noite lendo artigos sobre os prematuros e sobrevivência. Mal sabia que ali começaria uma luta diária na Uti Neonatal. Me arrumei no dia seguinte e fui para o hospital visitar minha filha. Era só começar a chegar na UTI, que meus olhos já se enchiam de lágrimas!

Assim que cheguei no andar me deparei com várias mães esperando liberarem a entrada pois estava em procedimento. Para mim era uma palavra nova, mas aprendi rápido a temê-la! Sempre que um bebê entrava em procedimento o medo de ser o seu ou ser algo grave era enorme! Naquele momento foi muito importante pra mim, fizemos um círculo de amizades em que uma dava apoio a outra, todas olhavam discretamente os bebês das amigas, para saber se estava tudo bem e uma chorava no ombro da outra. Foram elas que me deram forças todos os dias!

À partir daquele dia minha rotina virou Casa X UTI, eu chegava de manhã e só voltava de noite. Fazia todas as minhas refeições no hospital e quando sentava, era numa cadeira de ferro no corredor. Na primeira semana levei um enorme susto! Enquanto eu olhava minha filha, ela parou de respirar e perdeu a cor, chamei uma enfermeira, que correu com toda equipe para reanimá-la, me pedindo para sair. Nesse dia eu chorei tanto, que não sei de onde saíram tantas lágrimas, fui praticamente carregada pela minha mãe, imaginando que minha filha poderia não resistir. Mas no outro dia, vi que já estava tudo bem! A UTI é uma verdadeira montanha russa de emoções, cada dia é um dia. Percebi que eram várias etapas e tudo era bem lento, ali não se fazia nada com ansiedade. As médicas eram bem sérias e para conversar com elas precisava chegar bem cedo. Eu mendigava por uma palavra chamada "estável" diariamente e, quando ouvia, era bem reconfortante, entendia que ela não piorou!

Até chegar a 1kg, o bebê fica numa balança de ganha e perde peso e isso é horrível para qualquer mãe. Não estamos acostumadas a brigar por 10 gramas, mas ali dentro faz toda a diferença! Qualquer esforço que se faz com o bebê naquele momento, ele perde peso. Foi aí que a médica me indicou que fizesse Canguru sempre, para minha filha engordar com mais facilidade e se desenvolver melhor. Eu fazia 3 horas por dia e deu muito resultado! Foram utilizados outros métodos para um melhor desenvolvimento, como polvo e rede.
A equipe estava muito empenhada em ajudar os pequenos! Minha filha ficou 15 dias entubada, depois utilizou o CPAP e catéter até aprender a ficar em ar ambiente. Cada evolução era uma enorme vitória! Conforme o tempo, Maria começou a tomar várias medicações, pois a médica falava que ela fazia uns picos de saturação preocupantes. Logo depois vieram as transfusões de sangue, minha filha teve anemia por repetição e precisou transfundir mais de 3 vezes. E eu sempre perguntava sobre a evolução dela e a resposta era: “Mãe, o bebê está estável, é grave por conta da prematuridade, vamos aguardar."

Eu lutei muito ao lado dela! Aprendi que não se deve chorar ao lado da incubadora, porque o bebê sente, então eu cantava pra ela! Quando você passa a frequentar uma Uti Neonatal, sua vida se transforma, você passa a enxergar o mundo por outro ângulo nunca visto. Passei a me importar muito com cada bebê ali dentro! Teve momentos que fui para o corredor chorar por outra criança e pedir vida. Não é fácil estar ali! Precisa ter um psicológico muito equilibrado.

Minha filha foi transferida de sala 2 vezes, que mostrava que ela não estava mais tão grave. A última sala que minha bebê ficou foi a sala 3, ali pude ter maior contato e já podia pegar minha filha no colo a qualquer hora e sem ajuda. Pude colocar roupinhas pela primeira vez, podia levar shampoo e lenço umedecido. Para qualquer mãe de bebê a termo isso é normal, para uma mãe de prematuro, significa muito cada detalhe.

Quando ela alcançou 1.500kg passava mais tempo acordada e chorava bastante sentindo minha falta. Chupava os dedos querendo mamar. Eu sofria porque queria amamentar e não podia, Maria não tinha peso o suficiente para ir para o peito. Enquanto isso eu ordenhava 4 vezes por dia, para que ela se alimentasse do meu leite. Lembro de como eu chorava no banho estimulando meus seios e pedindo a Deus para que meu leite não secasse!

Foi então no dia 5 de novembro que finalmente eu amamentei com ajuda da fonoaudióloga. Um momento especial e inexplicável. A partir daí começa outra luta, minha filha acaba perdendo peso devido ao esforço da sucção. É a fase de adaptação do organismo, mas depois de uns dias tudo voltou ao normal. Logo em seguida ela passou a ganhar peso rápido e logo alcançou os tão sonhados 2kg, recebeu alta de vários médicos e eu estava bem ansiosa! Levava a saída de maternidade sempre na bolsa.

De repente a médica veio conversar comigo que Maria não ia ter alta pois refizeram os exames e ela estava novamente com anemia. Alta adiada para alguns dias e mais uma transfusão de sangue. Chegou o dia 21 de novembro às 15h, recebo a notícia que finalmente poderíamos ir para casa. Foram muitas batalhas, minha guerreira lutou com força pela vida e me mostra todos os dias a importância dela.

Tenho muito orgulho da minha filha e de estar ao lado dela em todos os momentos. Mesmo que tudo pareça impossível, acredite que vai dar tudo certo no final. Hoje (Maio/2020) Maria Helena tem 8 meses e se desenvolve muito bem, é uma bebê saudável e feliz!

saudável e feliz!

Responsabilidade do conteúdo por conta do autor, não reflete o posicionamento da ONG. Não nos responsabilizamos pela veracidade dos fatos.

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